Fábio Nunes
Periquito cara-suja (Pyrrhura griseipectus)
A Serra da Aratanha acaba de se tornar o primeiro sítio cearense de repovoamento de uma de ave brasileira ameaçada de extinção – o periquito cara-suja (Pyrrhura griseipectus). A iniciativa é pioneira no Brasil por adotar uma técnica chamada de translocação, que não se utiliza de aves nascidas no cativeiro, valendo-se apenas de exemplares livres transferidos de um lugar para outro. Nesse caso, com origem onde a população dessa aves foi aumentada com ajuda das pessoas.
O cara-suja é um periquito que vivia pontualmente em vários lugares distribuídos entre os estados do Ceará e da Bahia, mas que ultimamente era restrito a apenas seis pontos de ocorrência. O setor que abrigava mais exemplares era a Serra de Baturité/CE, que em 2010 contava com menos de cem exemplares em vida livre. Através de uma programa de instalação de ninhos artificiais e de muita educação ambiental, o cara-suja prosperou, fazendo com que seu contingente atual gire em torno de mil exemplares.
A partir desse aumento, alguns ninhos foram retirados durante a noite com periquitos dentro, sendo levados rapidamente para a Serra da Aratanha, onde já amanheceram dentro de um recinto grande o suficiente para abrigar um pedaço de floresta. Essa medida de segurança serviu para aclimatação das aves, que foram liberadas no menor tempo possível. A espécie foi extirpada da Serra da Aratanha há muito tempo, mas o lugar apresenta florestas exuberantes e resistência às secas em função da proximidade com o mar, de onde recebe umidade captada em seus altos picos.
A escolha do lugar veio seguida pela melhor notícia possível, pois apenas um ano depois do início das translocações, os 32 caras-sujas na Serra da Aratanha já reproduziram, ou seja, estão aumentando o bando por conta própria. Essa iniciativa é do Projeto Cara-suja, formado por pesquisadores que vestem a camisa da ONG cearense Aquasis desde 2005.
Além desse resultado planejado, algo inesperado aconteceu: quatro caras-sujas de cativeiro não tinham perspectivas de reintrodução, pois seriam usados apenas no processo de aclimatação, contudo, houve uma formação de casal com uma ave livre (apelidada de Lisbela), tendo ocorrido isso apesar das grades. Em cinco meses de convívio, o cara-suja prisioneiro reproduziu com sua parceira livre. Em suma, será libertado por ter sido reabilitado por um membro de sua própria espécie.
No Século XIX, além do tráfico de animais silvestres, essas aves foram alvo de políticas públicas de extermínio, pois eram exageradamente acusadas de prejudicar as lavouras de milho e algodão. O Projeto Cara-suja tem ajudado a tornar real a política vigente de combate à extinção de nossa fauna, pois essa se tornou uma das poucas espécies que tiveram seu grau de ameaça diminuído, também graças à repressão ao tráfico de animais silvestres, empreendida pelo Batalhão de Polícia de Meio Ambiente. Através da Secretaria de Meio Ambiente, o Governo do Estado do Ceará publicou sua primeira lista de fauna ameaçada e agora tem a oportunidade de criar Planos de Ação Estaduais que ajudarão a replicar a história do cara-suja para outras espécies que precisam de conservação.
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